terça-feira, 8 de outubro de 2019

MP tenta acordo com Usiminas para diminuir poluição em Ipatinga, mas siderúrgica não aceita

Usiminas/Divulgação

G1 Vales


MP estipulou prazo para que acordo seja firmado até 18 de outubro. Poluição pode ser a principal causadora do alto número de internações por problemas respiratórios no município. Ele é quase cinco vezes maior que a média nacional, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde e Ministério da Saúde.


O Ministério Público de Minas Gerais e a Usiminas, uma das maiores siderúrgicas da América Latina localizada em Ipatinga (MG), tentam chegar a um acordo para diminuir a emissão de poluentes na cidade. Nesta terça-feira (8) foi feita uma nova reunião entre o MP e a siderúrgica, mas segundo o promotor de Justiça, Rafael Pureza, apesar das conversas terem sido avançadas, nenhum acordo foi firmado.

Em conversa com o G1 nesta segunda-feira (7), o promotor disse que dois tipos de acordo estão em andamento. Um deles, em parceria com a Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), sugere que a empresa prepare e execute um plano de mitigação quanto à soltura de gases inaláveis no ar, principalmente Dióxido de Enxofre (SO2) e Dióxido de Nitrogênio (NO2). Porém, desde 2018, a usina não concorda em fazer o plano.

“Junto com a Feam, foram feitos alguns estudos com os dados de automonitoramento da Usiminas. Ela se monitora e ela sabe o quanto ela emite em cada uma das fontes, são dezenas de chaminés, dezenas de fontes de emissão. Com esses dados, se faz um estudo de dispersão para saber como que, de acordo com os fatores meteorológicos, se espalha pela cidade. Com base nesses estudos se chega nos valores para comparar com o que tá estabelecido nas disposições legais”, explicou o promotor.

Em 2010, a Usiminas começou a instalação de painéis digitais que monitoram a qualidade do ar na cidade. A empresa é responsável pela instalação e manutenção deles, e o monitoramento é feito pela Feam. Esses painéis fazem a leitura da qualidade do ar da cidade a partir de quatro pontos, e são medidos os gases poluentes e algumas partículas que ficam em suspensão. “Não se mede nesses painéis as partículas sedimentáveis, que é o ‘pó preto’, e as partículas ultrafinas”, explicou o promotor.

No último estudo, realizado em outubro do ano passado, as emissões dos gases feitas somente pela siderúrgica, não ultrapassavam o padrão que estava disposto na resolução da época. “A Usiminas não é a única fonte, é a fonte com mais potencial, mas existem outros empreendimentos, existem veículos, a cidade está em funcionamento. Então, não seria mesmo de se esperar que ela sozinha ultrapassasse”, disse o promotor.

Um outro ponto citado por ele, é que em novembro do ano passado foi publicada a Resolução Nº 491, do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), que modifica os padrões de qualidade do ar, considerando como referência os valores guia de qualidade do ar recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2005. As adaptações devem ser feitas progressivamente, até que se chegue a esse padrão, e não há um prazo para isso, segundo o promotor. “Aqueles dados que foram obtidos em 2018, antes dessa resolução, eles poderiam estar superiores à previsão atual”, afirmou.

“Propusemos à Usiminas que sejam feitas melhorias nos painéis de medição, para que fiquem de acordo com os padrões da OMS, porque hoje estão fora deles”, informou Rafael Pureza.
O promotor falou ainda sobre o princípio da melhoria contínua, que diz que “mesmo que você não esteja ultrapassando determinados padrões, você tem a obrigação legal de buscar, sempre, melhorar o seu desempenho ambiental. O Ministério Público entende que pelo princípio, a empresa deveria apresentar e executar o plano de mitigação”, explicou.

Em Ipatinga, há uma Lei Municipal de número 3.279/2013 que trata do Índice de Qualidade do ar na cidade, mas, segundo a Prefeitura, a Lei não esclarece os parâmetros a serem utilizados como referência e nem estabelece critérios claros e objetivos acerca das sanções decorrentes do descumprimento. Por isso, não haveria como aplicar multa com base na referida Lei.

Termo de Ajustamento de Conduta

Além da emissão de gases inaláveis, o MP tenta buscar um acordo através de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para solucionar problema das partículas sedimentáveis, o famoso ‘pó preto’, no ar da cidade. Diante da negativa da siderúrgica, a promotoria estabeleceu o dia 18 de outubro como data final para as tentativas de negociação.

De acordo com o Ministério Público, as investigações sobre o ‘pó preto’ começaram em agosto de 2016, “já tendo sido constatado que, em diversos locais do município, ocorre deposição de partículas sedimentáveis em índices muito superiores ao máximo permitido”, informou.

No TAC há várias propostas de medidas a serem cumpridas pela siderúrgica, como instalar uma rede de monitoramento para o ‘pó preto’, fazer correlação dos materiais relacionados, fazer a constatação e implantar sistemas que permitam a redução dessas partículas.

Segundo o MP, o recomendado é que o padrão tolerável das partículas sedimentáveis, em áreas urbanas, seja de cinco gramas por metro quadrado em 30 dias. Porém, a Usiminas enviou ao órgão dados de uma pesquisa do padrão da qualidade do ar, coletados nos três primeiros meses do ano. Eles mostram que em três bairros da cidade, o índice está muito acima do recomendado.

O estudo mostrou que, entre janeiro e março deste ano, a quantidade de partículas sedimentáveis no Bairro Bom Retiro está em torno de 10 gramas. No Bairro Cariru, o nível varia entre nove e 11. No Bairro das Águas, os índices são ainda maiores; em janeiro foram 42 gramas, em fevereiro 36 e março 28.

“Como as negociações vêm se arrastando há bastante tempo, o Ministério Público se posicionou que vai encerrar as tratativas dia 18 deste mês. Caso não haja consenso, o Ministério Público vai tomar outras providências não consensuais, por exemplo, judiciais se forem necessárias”, afirmou o promotor.

“A situação é desanimadora, é desagradável, é uma coisa que traz doenças e dificuldades para os familiares”, disse aposentado Paulo Dantas, que é morador do Bairro das Águas.

Problemas de saúde

A poluição pode ser uma das causadoras de uma grande preocupação em Ipatinga, principalmente pela emissão dos gases inaláveis. Dados apurados pelo G1 com a Secretaria Municipal de Saúde, apontam que em 2017 foram registradas 4700 internações por problemas respiratórios. No ano passado, foram 6100. Em relação a atendimentos ambulatoriais pelo mesmo motivo, em 2017, foram registrados 15 mil. No ano passado, 22 mil. Segundo o Ministério da Saúde, o país teve aproximadamente 560 internações a cada 100 mil habitantes em 2018, conforme apurou a CBN. Ou seja, a média do município é quase cinco vezes maior que a nacional.

Gretel Kelly Fernandes, empresária, disse que o neto de 10 anos sofre com problemas respiratórios e que todos os anos precisa fazer tratamento. “Ele faz acompanhamento com pediatra e todos os anos ele precisa tomar um remédio durante seis meses. Ele tem uma tosse feia, você precisa ver”, contou.

Em nota, sobre os dois assuntos citados na matéria, a “Usiminas informa que está em tratativas com o Ministério Público de Minas Gerais sobre o tema”.

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